sábado, 16 de maio de 2020

TEU TEXTO

"Saí da sua vida de cabeça erguida
Coisa que você não fez
Eu já chorei demais agora vem a sua vez
Eu acho que vai ser melhor..."
(Matogrosso e Mathias - Na hora do Adeus)






     Eu tinha prometido escrever uma coisa bem bonita pra você. Me lembro que já tinha até começado e guardei um rascunho no meu bloco de notas onde fica tudo: as listas do supermercado, os compromissos importantes, as ideias para os livros, os slides de apresentações, reflexões e afins. Trouxe você pra dentro dos meus arquivos e da minha vida, com acesso total. Acontece que ontem eu vasculhei tudo. Revirei todas as notas e não encontrei aquele parágrafo que fiz pra ti. Na frente do computador, fechei os olhos e me esforcei pra lembrar tudo que tinha escrito. Não me veio nada. A única coisa concreta foi aquele texto reticente de felicidade que eu vomitei no Ano Novo.
     Fora isso não tem mais nada agora. Só mágoa. Uma pontada silenciosa de tristeza durante todo o tempo em que estou acordado. Não me conformei com a insignificância gratuita que você me deu. Inventou importância pra fingir compromisso, mas a máscara foi frágil. Peguei você no meio das suas mentiras ultrajantes e você só disse: depois a gente conversa. Não conversou. O olhar frio, com medo de se expor. Não teve medo de mais nada além disso, nem de jogar o que eu sentia ali mesmo, no chão daquela calçada íngreme, e ver tudo escorrer para o ralo mais próximo ou se estilhaçar com a queda. Não teve consideração. Empatia. 
     E agora eu enxergo a verdade: tudo isso que você não teve foi culpa minha, fui compensando o que faltava. Compensei as ausências noturnas com disponibilidade fiel, compensei falta de carinho com atenção em excesso, cobri os olhos pra não ver os sinais. E agora lamento. Sozinho. Porque foi sozinho que fui o tempo todo leal com o nosso compromisso. Cresci gigante pra te proteger do sol e você escolheu acabar pequeno demais.




Oswaldo Juliano Sandi