terça-feira, 2 de abril de 2013

SOBRE O PRIMEIRO ENCONTRO E SUA INEXISTÊNCIA

De todas as formas que eu tentei te imaginar,
nenhuma delas é esta que você usa cegamente,
sem medo de ferir ninguém.

***

Meus passos cuidadosos,
jamais desenfreados,
temem emitir qualquer ruído
que vença a distância e te acorde do teu sono.

***


É por motivo de tanta diferença que eu decido agora descrever o nosso inexistente primeiro encontro.


Seis meses não são uma vida. Seis meses é apenas tempo suficiente  para que um coração se apegue e outro pisoteie. Em seis meses podem existir encontros inúmeros e, igualmente, rompimentos dolorosos e cicatrizes para carregar por uma vida.

Um encontro foi marcado.
Como menino, pensei cada detalhe, preparei a roupa, comprei roupa, comprei doces, comi doces, chocolates que trouxessem qualquer ar de felicidade e alegria. Pensei falas, pensei monólogos infinitos de comédia e, quem sabe, drama.
Viajei a mesma distância que você viajaria para chegar até mim — mas recusou. Corri por caminhos cansativos, sorrindo, as pernas arranhadas por espinhos... sorrindo...
Viajei com o coração a mil, tomando remédios pra dormir e chegar descansado...
Você não preparou meu pouso, só me acompanhou a caminho. Você me deixou ali para dormir o sono que eu não queria dormir. Eu queria era viver. Porque paguei todos os preços e cifras, mesmo os incalculáveis. Queria dormir em ônibus lotados e viver em ruas desconhecidas. Viver meu amor talvez repassado em falas, cenas e músicas — infinitamente...
Quando a noite veio, sobrei no seu atraso, participei como um prato só na mesa, mesmo estando acompanhado. O olhar vago, ouvi de outros as histórias que preferia ouvir de você, conheci por outros os caminhos que você trilhou e me contou com toda luz, mesmo que tenha trilhado a todos na escuridão, como descobri naquele momento amargo. Conheci o seu outro lado e, nos caminhos por que passamos durante nosso encontro, te admirei, solitário, com meu olhar aflito, querendo retribuição. Você jamais sentiria a solidão imensa que eu sentia... Você estava acompanhado e eu, sozinho. Acompanhar a amizade dos outros é vislumbrar a solidão que tem dentro da gente... Chorei calado por todas aquelas horas, porque finalmente paguei o preço amargo que é o que se paga pra ser rejeitado, ser deixado de lado — se entristecer e, ao mesmo tempo, se sentir culpado por estar triste.
Depois disso corri. Fugi da tolerância que desconstrói o que eu construo diariamente com cada grão minúsculo das minhas forças. Fugi de medo. De ver desabando todos os meus castelinhos de areia que você talvez enxergue com desprezo — e mesmo assim são meus.
Corri com lágrimas nos olhos e relutando pra voltar.
E sucumbi.
Voltei atrás. Corri atrás. Fui ao seu encontro, sem bateria no celular, com o coração em pedaços... Sem energia pra pedir sequer um perdão. Mas mesmo assim, tirei energia de onde não tinha, coloquei estes seis meses numa máquina e espremi, escorri um sumo amargo e bebi pra ter força. Pra tentar. Pra ser o adulto que eu achei que você queria. Fui atrás de você com o coração exposto do lado de fora do peito, e você cravou suas mãos nele — com prazer e sem armas — dilacerando uma vez... duas vezes...
Voltei pro hotel sangrando. Sentindo a dor pressionar meus olhos, meu corpo, minha dignidade, meu orgulho que eu jamais entreguei a ninguém senão você mesmo... a troco de NADA.
E pior, ainda voltei atrás muitas vezes depois. Sem coração dentro do peito, oferecendo migalhas de mim que eu é que deveria estar catando pelo chão. Ajuntando em um balde pra reconstruir aos poucos o que se quebra em momentos curtos de tempo.




Colóquio:
— Eu deveria fazer algo... Mandar algum email, alguma mensagem solicitando por favor, que me recuse com todas as letras. Me dizendo pra ir embora...
Ela: Mas já não é o bastante? Que demonstração maior você quer pra seguir em frente? Depois de tudo, você ainda acha necessário ter isso em palavras?
Na minha ingenuidade, respondo:
— Mas eu sou feito de palavras... eu preciso delas...



Oswaldo Juliano Sandi

Um comentário:

Natália Candido disse...

É um texto tão concreto que posso enxergar todas as cenas descritas!